"O tempo passa, eu também!"
No fim de 2011 saiu o novo dos Trabalhadores do Comércio, "Das Turmêntas hà Boua Isperansa" que, por razões "logísticas", me chegou neste início de 2012. Curiosamente vi-me com mais tempo para estas andanças da "crítica musical" (por oposição a outras agora mais paradas) e achei, perante a imponência da coisa, que não ia daqui sem uma palavrinha ou duas.
Para começo de conversa, tenho a dizer que nunca vi até hoje nada, em termos de edições musicais portuguesas, que se chegue à qualidade desta nova obra dos Trabalhadores do Comércio. Pelo preço de um CD (e nem é dos caros) temos acesso, não só ao propriamente dito, mas também a um livro que conta, numa envolvente gráfica muito bem conseguida, entre imagens de antologia e documentos de inegável interesse histórico para a compreensão daquilo a que se convencionou chamar o "Boom" do Rock Português no início dos anos 80, a história dos Trabalhadores do Comércio. Entre episódios mais corriqueiros e outros mais escabrosos, a escrita de Sérgio Castro dá a sequência devida ao tempo e à gente que passou pela banda. Muita informação. Tanta que, não tendo ainda chagado ao fim da leitura, achei que já era mais do que tempo de fazer a divulgação.
Eis-nos então chegados à música do novo CD dos Trabalhadores do Comércio. Preparado para mais uma barrigada de boa disposição, a primeira audição reservava-me uma pequena surpresa: sim, as letras continuam mordazes mas, comparado com a atitude trocista e irónica de quase todo o anterior "Iblussom", este novo álbum traz mais raiva do que festa, mais política do que costumes e mais nomes nos bois (ou boys?). Mas sempre, como sempre, com muito boa música. Se as letras reflectem o espírito de quem as escreve (mais arrevezado João Médicis, mais directo Sérgio Castro), a música estende-se, como é hábito, por vários estilos musicais unificados, como já acontecia em "Iblussom", pelo reconhecível e distinto som "à Trabalhadores". Começando no épico prog-cinéfilo "Hino à Desanexassom" e terminando no exercício tecno-político "Fantuxada Mix" (com participação especial de ex-ministro e tudo), a barca da "isperansa" navega por entre ondas Funky, Rock e Blues com espuma Country, Doo-wop ou mesmo Surf-Rock à Beach Boys (terei sentido lá atrás um balanço Arte & Ofício?), tudo "compactado" pela boa tecnologia do século XXI.
Se não há maus momentos? Bom, será talvez uma questão de gosto mas eu teria dispensado a nova versão em jeito de "Bolero" de "A Cansão Quiu Abô Minsinou". De facto não gostei da nova roupagem mas há que dizer que, das músicas dos primeiros tempos dos Trabs, esta seria talvez a minha preferida e continuo a achar um achado aquele balanço "Reggae-fadunxo" do original. Tirando isto, apenas o pequeno erro da troca de ordem no disco entre "Dálhe cordÓ Cucu" e "Abestruzurbana", que se torna chato para um tipo picuinhas como eu.
"Das Turmêntas hà Boua Isperansa" é, então, um disco menos bem disposto do que o seu antecessor mas, em todo o caso, um excelente trabalho. Ao fim de 30 anos a formação está unida e estabilizada num colectivo de excelentes músicos. A banda é grande? Bom, já não é o trio de antigamente mas eu diria que não há ninguém a mais. E isto inclui os convidados!
"hà Boua Isperansa"! Se o próximo for uma festa será bom sinal... ou velhice?
Fica aí a tocar:
"Gladiador"
Artista: Trabalhadores do Comércio (letra de António Garcez)
Álbum: "Das Turmêntas hà Boua Isperansa"